06 novembro 2011

The Brave



E passeia ele na estrada pirata de desertos, acompanhado pelo calor e pelas miragens de reconhecimento. Tem os pés descalços, é o único que irá cumprir a profecia para que o irmão lhe lave os pés. De vestes pretas e mente iluminada, a barba de nada lhe serve senão de conforto contrastado ao luto dos que partiram. Teve o azar de ser o único bravo e corajoso, teve o azar de ser eternizado.
   Levado pelos senhores de gravata que servem a sociedade, carrega às costas um povo adormecido de fábulas e uma inspiração contraditória aos olhos dos mais - e muitos - distraídos. Bebe água de coco, ainda não perdeu o hábito. E não espera por chegar ao destino da estrada deserta que lhe grelha os pés: toma um passo de bebé que me desconcerta, esperando que o povo perceba quem é ele e que algum padre, que devia ter-lhe respeito, lhe deixe falar sem gaguejar.
   Mas consegue sorrir-me pacientemente ao ver-me passar de carro na estrada quente no meio do deserto americano, porque milhares de anos ensinaram-no que o Hoje é uma mescla de realidades distorcidas, histórias com excessiva pontuação e escarretas no olho de alguns. E continua a andar porque já lhe está no sangue o espírito negro de sacrifício e a alma de artista que não precisa de ser reconhecida ou lembrada para focar-se na profecia.   

5 comentários:

  1. Gostei. As imagens foram-se construindo na cabeça. A história foi-se escrevendo em mim.
    Fez-me lembrar isto... http://diascaes.blogspot.com/2011/04/deus-e-o-diabo.html

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  2. Adorei este! :)
    Parabéns!
    (e sim, Madonna continua espectacular!)
    -Pedro Rei
    www.pfashionroyalty.blogspot.com

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  3. a densidade da tua escrita é fascinante.

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