30 setembro 2010
Lullabies
Tenho-te lido a verdade antes de adormeceres.
Mas tu amordaças-me os papéis e logo de seguida adormeces, prontinha para sonhar.
27 setembro 2010
I make a wish, you make it happen.
Gostava de ter dois filhos de cacau.
Viagar dentro de água: sentir o vento do mar.
Curtir a música do silêncio profundo.
Deitado sobre silvas, poderia sentir vida e êxtase.
O fogo iria certamente acariciar-me o corpo e pentear-me o cabelo.
Viver dentro de uma vela e navegar dentro de uma luva. Que me assentasse como tal.
Deixar de viver e passar a sobre viver.
Tragedy, oh tragedy
Ninguém lhe acha graça nenhuma, mas a tragédia é inevitável.
É tão concebível de acções como o ar que vem das árvores.
Hoje somos seis biliões de pessoas, cada uma com uma lição para dar. E quando morrermos, seremos um amontoado de lições que não foram partilhadas.
Seis biliões de tragédias inevitáveis.
Em contra partida, o Homem lida com a tragédia.
O ser humano tem consciência de que Morrem fiéis desesperados todos os dias, que existe a fome no mundo e que o nosso país vizinho trava uma guerra há inúmeros anos.
Mas nada se faz.
O ser humano habitua-se às tragédias.
25 setembro 2010
Peraltadas de altas horas.
17 setembro 2010
Foge, foge.
- É esse o meu problema, Inael.
Inael via nas faces do amigo um certo rubor rosa, invadindo-lhe de rompante e violentamente as maçãs do rosto. Em sete anos de pura e dedicada amizade, Gargo nunca lhe tinha feito uma confissão destas. Daquelas confissões íntimas, das que a gente só conta a nós mesmos.
- Mas nunca tentaste saber um porquê?
- Porque tenho medo. E pronto. - respondeu-lhe, resoluto. - Eu sempre disfarcei, mas desde pequeno que sempre foi assim.
O quadro negro do céu já começava a ser preenchido nitidamente pelas estrelas, chegando sem pontualidade, umas depois das outras, cumprimentando os dois rapazes.
Inael perguntou-se no que se transformariam se caíssem na Terra. Talvez as pérolas viessem das estrelas:
- Tem de haver um porquê.
- Não há porquê. Nem solução. - Gargo pousou a mão no ombro do amigo, a cara prateada da lua. - Mas está tudo bem, a sério. Já me habituei. Hoje em dia é como comer, para mim.
Os olhos de Inael quiseram fugir-lhe da cara e, depois, a face descontraiu-se num sorriso troçante.
- Ahã, tentares fugir do teu próprio corpo desde sempre é tão normal como comeres.
Gargo não suportou a troça. Levantou-se da arriba e continuando a olhar para o amigo, limpou o musgo dos joelhos:
- Fodasse! Eu sabia que não devia ter-te contado.
- Tem calma... Estava a brincar. - tranquilizou-lhe Inael, olhando para cima; a cabeça do amigo tocando o céu de pérolas.
Mas a Gargo, bateu-lhe fundo. Virou-se e seguiu a estrada de terra batida e gravilha até se lembrar. Passado um pouco olhou para baixo, olhando os seus pés avançando sobre as pedras do caminho que corriam contra a sua direcção. Ficou assim durante um tempo indeterminado. Não sabia se um minuto ou uma hora.
Gostava de andar à noite, a única luz que tinha consigo era a Lua, dando-lhes apenas espectros tão fracos que não chegariam para existir uma concreta definição do seu corpo. Via apenas pequenas formas pretas atrás dos seus pés, à medida que avançava. Uma sombra indefinida.
Não havia que ter medo, pensou.
Continuou a andar até uma coruja, sobre um ramo de macieira lhe chamar a atenção, com a sua cabeça achatada e de olhos amarelos. Por baixo da árvore, estavam dois pneus, alinhadamente sobrepostos e Gargo sentou-se nele. A sensação de estar seguro numa bóia sobre uma piscina fez-lhe sorrir. Encostou a cabeça ao tronco.
- Tu não queres saber o porquê, pois não?
Gargo pulou dos pneus, um pneu quase vindo arrastado ao seu rabo. Ouve uma voz. De uma mulher. Atrás de si. Enquanto o coração batucava, Gargo não tirava os olhos da direcção de onde vinha a voz. O vento passou-lhe a mão pela cara e notou que já transpirava de espanto. As folhas da macieira fizeram-lhe uma vénia perante a brisa e o tronco da árvore mexeu-se de uma maneira que Gargo nunca mais se esqueceria.
- Diz-me lá. Tu não queres saber o porquê.
Gargo decidiu responder-lhe pouco depois de ter aceite a sua insanidade mental:
- Não. Faz-me pensar demasiado no assunto e assim fico ainda mais medo. Não gosto de ver a minha sombra. Não gosto, não gosto, não gosto. Tenho medo.
- Há uma solução.
- Eu sei, só que eu ainda não a encontrei. Dizes-me?
As folhas levantaram-se preguiçosamente, parecendo estarem cansadas da vénia feita ao passar do vento e a árvore tomou uma postura mais limpa.
- Senta-te de novo, mamífero.
Gargo achou o nome ridículo. Voltou a colocar os pneus no lugar e sentou-se de novo, com a cabeça encostada à árvore. Por momentos, perguntou-se se a sua nuca lhe estaria a tapar a boca.
- Fecha os olhos. Pronto?
to be continued.
15 setembro 2010
14 setembro 2010
Sem título
Eu escrevia-te sempre cartinhas, daquelas amarelas com bolinhas e enfeites bonitos a meus olhos. E dobrava as cartas, numa tentativa desorganizada de origami, pensando que tu gostasses.
Depois punha-me a puxar todas as cerejas que queria colocar em cima do bolo, para teres um título bonito, que te fizesse gostar mais das cartas. E de mim. De nós.
Vá, eu não sabia se apreciavas a minha dedicação, mas tu respondias-me quase sempre.
E nessas cartas, que até tenho aqui guardadas comigo, tu sempre te esqueceste de colocar um título.
Foram anos a desdobrar papéis ao ler a tua tinta preta de caneta de feltro. Éramos crianças e tinhamos a idade da Terra.
Tu hoje olhaste-me os nós dos dedos e disseste-me que não queres saber do que te vou falar, que só queres ler a minha escrita entrelaçada na confusão.
Nunca te interessaram os títulos, realmente.
12 setembro 2010
Louder.
Diz-me uma música bonita de se ouvir, daquelas da beleza dos sonhos.
Onde as meninas usam vestidos que voam por si só
e os meninos não deixam voar os chapéus.
Dá-me aquelas notas musicais onde cheiramos os tecidos de Versailles
dos quadros de nossas casas, que as donzelas nunca chegaram a usar.
As músicas dos chás, as melodias de seda e as pausas do romance.
As músicas que sempre me cantaste com o expirar do teu embalo.
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