13 outubro 2011

Bravo Zulu!


Estás gasto, a alma já te é velha e o corpo já te produz bolor em cantos teus que desconheces; mas eu ainda consigo lembrar-me dos tempos em que o nosso chão lentamente balançava, dia e noite, enquanto as meninas arregaçavam o saiote e dançavam com as ceroulas à mostra, em cima da antiga porta lisa e grande do palácio que, ali, servia de mesa de jantar. O nosso sapateado não era ensinado, era criado e gozado com os jarros de barro salpicados do vinho tinto que lá dentro sambava, depois de esmagados pelos nossos pés.
Apreciava-se aquilo tudo, comendo os peixes com a espada ou com os ganchos de quem a mão faltava e esfregando o piço ao escroto enquanto as virgens e os virgens passeavam pela proa com velas pedindo histórias de embalar às mães que morriam de sede vindimal. Nunca cantámos  maldade, apesar da pobreza se deitar connosco em nossas camas todas as noites, porque o vinho bebia-se e o chão embalava-nos - de tanto vinho a ele entornado - para um mundo onde "Terra a vista!" era desconhecido. Morávamos noutro mundo, era nosso. E que Dionísio chamasse Poseidon para nos ajudar também! Saltava-se à mesa, pisavam-se os pratos, arregaçavam-se saias das meninas que em cima da mesa quase batiam com o cabelo finalmente solto nas lâmpadas a petróleo, entrava-se em umas quantas ali no canto do rancho, batia-se o pé e bebia-se mais vinho roubado da reserva para o comandante, que diziam as aias da princesa de Queluz que dava mais tesão.
E só não chamámos os tubarões que nos rondavam o barco porque quando o diafragma pulava também, o cantar alto já fazia os bichanos abanarem as ancas. Os coitados acabavam por zelar por nós, ai! das mulheres-polvo gigantes e os Tritões que procuravam as primogénitas desaparecidas que quisessem beber também - mal sabiam eles que o peixe e a carne das filhas eram comidos na cama dos comandantes!

1 comentário:

  1. Mas a distância às vezes dá cabo de nós. Pelo menos dá cabo de mim, e atrapalha grande parte da minha vida s:

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