13 novembro 2011

Diplomas

Olha aquele herói sentado no banco, podre de pombos esfomeados e iluminados porque quando voam vêem o mundo de longe. Tem as calças rotas, tão sujas que não dá para reparar que já foram ganga branca; e os cabelos não se foram enrolando uns nos outros por distracção. Decora as caras de quem, por bondade, lhe dá comida e até nem gasta todos os trocos para a droga. Dorme na rua chuvosa ali a baixo da rua do Carmo, quase ao pé do Pingo Doce, e despreza os mais ricos.
  Olhou para mim pela primeira vez com um menosprezo governado pela paciência, como um pai paciente que espera o filho aprender sobre a vida. Não gostei. Juro que não gostei. Nem eu nem os empresários, os políticos e os mentirosos – profissão, calejados de fábulas.
  Descolou-se dos rótulos e simplicou a sua própria vida. Aceitou a divindade que lhe foi dada e decidiu não fazer parte do ignorante sistema social. Dedicou-se profundamente ao sistema humano. E não soube o que lhe responder quando me perguntou se ele é que era o artista, o alucinado e o inconformado. Aquele herói que vive na casa do mundo cuja pele escura e suja fede, é a única alma iluminada abaixo da rua do Carmo.

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